sexta-feira, 25 de março de 2016

LIberdade e Destino (Maktub)


Elias Boainain Jr. 
  • Na verdade o Existencialismo, assim entendo, superou estas duas visões (sou determinado pelo destino ou o destino me determina) que, de certa maneira, são apenas duas facetas (ou versões) da mesma dialética do dominador—dominado. O Existencialismo nos da outra possibilidade. O "destino" é entendido pelos existencialistas como aqueles aspectos da nossa existência que de fato são exteriormente determinados, não são de minha escolha, me são impostos quer eu queira ou não, a começar das "condições de lançamento", a situação como fui lançado no mundo. Nasci ser humano, homem, brasileiro, com determinadas características genéticas, em uma família, e nada disso fui eu que escolhi foi o meu "destino". Da mesma forma, saio à rua e me acontecem coisas imprevistas que não fui eu quem fiz, quis ou escolhi (um prosaico pneu furado, por exemplo). Foi o destino. Mas isto, de forma alguma tolhe minha liberdade e minha responsabilidade frente minha existência, pois se liberdade é a possibilidade de escolha e se responsabilidade é possibilidade de responder, frente a qualquer destino eu não só posso como sou obrigado a responder ("condenado a liberdade", diria Sartre). E isto (minha resposta) não é determinada pelo destino (salvo o fato de que sou livre, sempre e inescapavelmente livre, ser livre faz parte de meu destino e isto eu não escolhi ser nem posso mudar - embora possa escolher agir de "má fé" fingindo que não sou livre para escolher e responder). "Ser livre não é fazer o que quiser, mas fazer o que quiser com o que fazem conosco". Parafraseando esta frase (mais ou menos acho que foi isso que ele disse) de Sartre, a liberdade não é fazer o nosso destino, criar o destino que quisemos, mas sim responder a ele, escolher o que fazer com ele.

  • A cada ação minha, seguem-se conseqüências (muitas delas imprevisíveis e acidentais - e por vezes tão mais imprevisíveis e surpreendentes quanto mais inteira, livre e autêntica foi minha ação) às quais será necessário novamente responder. Dou minha resposta e aguardo o que o destino responda, e novamente dou minha resposta. Na verdade dependo da resposta do destino para poder responder, dependo de uma situação concreta para poder exercer concretamente minha liberdade. Não há contradição entre liberdade e destino, mas interdependência. Da mesma forma que não há oposição entre a vida e a morte, pois se o nascimento e a morte são os acontecimentos máximos de nosso destino, nossa existência inteira (o que fizemos com este fato inescapável de que nascemos e vamos morrer) é a nossa livre resposta a estes e aos outros acontecimentos menores através dos quais, a todo momento, o destino nos interpelara e pedira nossa resposta. 

  • Não creio assim que seja correto dizer que moldamos livremente nossos destinos, mas sim que, respondendo livremente a ele criamos a nós mesmos. E só na medida em que damos respostas livres e autenticas, ou seja, nossas respostas, é que também podemos receber do destino as respostas que são realmente para nós (e não para uma mentirosa versão de nós mesmos, o que fatalmente levaria-nos também a um desvio de nosso "destino verdadeiro"), ou seja, nosso, destino. Assim, podemos dizer que ser livremente a si mesmo, dando respostas autênticas (que mais plenamente expressam quem sou), é aceitar e ir de encontro ao próprio destino, já que tanto o destino quanto nosso próprio ser (sejam os autênticos e verdadeiros, sejam um falso ser e um falso destino) se criam e se desvelam juntos, no "entre" de sua relação. 
“Destino e liberdade juraram fidelidade mútua. Somente o homem que atualiza a liberdade encontra o destino. Quando eu descubro a ação que me requer, é aí, nesse movimento de minimizar liberdade que se revela o mistério. (...) Àquele que se esquece de toda causalidade e toma uma decisão do fundo de seu ser, àquele que se despoja dos bens e das vestimentas para se apresentar despido diante da Face, a este homem livre, o destino aparece como réplica de sua liberdade. Ele não é o seu limite mas o complemento; liberdade e destino unem-se para dar sentido; e neste sentido o destino, até há pouco olhar severo suaviza-se como se a própria graça” (Buber, “Eu-Tu”, Cortez Morales, 1979, pág. 62). 

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